quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Não tem cabimento

 A lua em câncer. Doeu, mas foi.
O tempo sufoca, minha amiga, e sobra esse choro carente de ser chorado. Chega a me apertar a garganta. Estranhíssima essa relação que tenho com o crescimento. Estranhíssima. Não sou exatamente como as árvores, crescendo para o céu, para os lados, dando a tranquilidade da sombra. O crescimento repleto de tranquilidade. Como é possível? Eu podia dormir, mas não ia passar. Eu ia continuar crescendo. Eu sinto os pés esticarem, quase não caberem na cama, sobrarem no edredom, eu vejo. As mãos maiores, o rosto maior, os cabelos. Nada me salvaria desse crescimento irreversível, dessas dores apertadas num corpo que parece maior mas que é tão pequeno, ami, é pequeno. Nada me salvaria desse amor que expande três vezes mais a cada centímetro que eu pareço alongar. Do amor nada jamais vai me salvar. Dessa coisa que grita, que me sacode. Dessa coisa que sou eu. Desse eu. E eu, quem eu sou, arde dentro do peito. Aí eu sinto medo do crescer. Medo dessas coisas tão barulhentas que criamos carro máquina lugares fechados pensamentos. Não é que quero ser como aquele personagem que não cresce. E que voa. Eu não quero ser nenhuma personagem. Só quero caber em qualquer coisa na cama no edredom na cabeça no coração eu só quero caber. Dormir no acolchoado da vida e crescer como a árvore. Falamos da aceitação dos processos, sobre a transitoriedade das estações, da efemeridade. Mas nada disso faz passar. No fundo, a nossa história se mistura, se dissolve, nas coisas que somos hoje e gritam. Não é vontade de voltar. Tem uma passagem que dizia, e eu até acho que era bíblica, que quem olhou para trás ficou congelado para sempre. Congelado nos prazeres que passaram. Congelado nas coisas que parecem bonitas agora, vistas de outro jeito. A lua em câncer. A história misturando tudo. Eu respiro. Deve ser isso que dizem ser saber viver. Respirar. O compasso do respiro eu conheço de cor. Sentir o vento do presente bagunçar o cabelo. Eu só quero deitar no chão e esticar o corpo. O corpo no chão. O contato no chão. Só o agora existe. Só o agora.

Nenhum comentário:

Postar um comentário