sexta-feira, 8 de novembro de 2013

na caixa de correios, uma surpresa: te entregaram um abraço

Querida Enriqueta,
escrevo essa cartinha para te animar. Na realidade, sabemos todos que o mundo anda mesmo complicado demais, muito mais do que quando tínhamos só três ou quatro anos. No entanto, sei que sabes que a preocupação de outrora parecia infinitamente grande e impossível de se solucionar. Mas solucionou. Isso te dá esperança, Enriqueta? A mim, enche o coração de uma certeza muito boa: todo nó há de se desatar. E muitas vezes nem precisamos mover montanhas para isso. As coisas acontecem, se desenrolam, seguem seu curso natural. A vida não é só feita de pesadelos, embora encontremos tantos e tantos pela vida, às vezes chega a dar medo de dormir, não é? Mas sabe... há menos monstros do que acreditamos, acreditamos, muitas vezes, em monstros que só nós vemos. Será que não está na hora de guardá-los dentro do armário, trancar e engolir a chave? Deixá-los lá de castigo por um tempo. Não olhando para os monstros (que, volto a te dizer, são poucos) podemos enfim viajar por um mundo que é encantador e simples, livre de amarras e visões ruins, um universo abraçável e cheio de abraços espalhados, como o que te envio embrulhado num papel bonito e laço de fita pelo correio. Importante é saber, Enriqueta, que podemos viver o mundo que quisermos viver. A felicidade é tão grande e bonita, e também vive sempre nos cantinhos em que mais nos descuidamos no olhar, passa despercebida porque sempre as tempestades parecem maiores que as flores. Mas conte comigo quantas flores há e quantas tempestade há. E para qual olhamos, muitas vezes? Vamos olhar para as flores? A vida é tão generosa, Enriqueta. Mesmo que o sol não abra exatamente no momento em que desejaríamos que ele abrisse, não é generoso saber que ele vai voltar em algum momento? A vida é de uma bondade...
Nessa noite só quero te lembrar que os pesadelos são só sonhos entendidos errado. Que podemos ver tudo de um outro jeito e que ter medo de sonhar não quer dizer que se é fraco, mas que se precisa de óculos, me entende?
Não precisa ter medo. Estou com você.
Boa noite.
Abre tua caixinha de correio e sentirá meu abraço lá. Tem muito carinho contigo, saiba disso.
Estamos todos no mesmo barco e ficaremos todos sãos e salvos, e isso acontecerá também por estarmos juntos nessa.
Cariño,
Calu.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

A hora do cansaço - Drummond

As coisas que amamos,
as pessoas que amamos
são eternas até certo ponto.
Duram o infinito variável
no limite de nosso poder
de respirar a eternidade.
Pensá-las é pensar que não acabam nunca,
dar-lhes moldura de granito.
De outra matéria se tornam, absoluta,
numa outra (maior) realidade.
Começam a esmaecer quando nos cansamos,
e todos nos cansamos, por um ou outro itinerário,
de aspirar a resina do eterno.
Já não pretendemos que sejam imperecíveis.
Restituímos cada ser e coisa à condição precária,
rebaixamos o amor ao estado de utilidade.
Do sonho de eterno fica esse gozo acre
na boca ou na mente, sei lá, talvez no ar..

A bagunça dela

"- Em outros termos, prefere imaginar uma relação com alguém ausente que criar laços com os que estão presentes.
- Ao contrário, talvez tente arrumar a bagunça da  vida dos outros.
- E ela? E a bagunça da vida dela? Quem vai pôr ordem?"

Quem?